sábado, 22 de agosto de 2015

Ninguém me avisou

Quando eu era adolescente, dizia sempre que teria meu primeiro filho aos 27 anos, e que depois teria mais dois. Três no total. Esse era um assunto frequente entre amigas e eu já tinha os meus planos traçados. Sequer pensava se precisaria encontrar um marido ou parceiro para isso: tinha certeza de que teria meus três filhos, começando aos 27 anos. Só que ninguém nunca me falou que eu talvez não conseguisse. Que talvez eu não pudesse. Que talvez eu tivesse problemas de fertilidade. Que talvez eu fosse passar mais de três anos tentando engravidar. Que talvez fosse preciso economizar para fazer um tratamento caríssimo.  Que talvez eu tivesse que fazer exames dos quais ninguém nunca ouviu falar, tomar mais de 60 injeções e uma série de remédios diariamente. Eu não fui preparada para essa possibilidade. Nem eu e nem nenhuma outra mulher.

Minha primeira ida à ginecologista foi aos 16 anos. Muito jovem para que a questão fosse abordada, concordo. Mas, desde os 18 anos, passei a fazer as consultas anuais recomendadas. Tive médicas diferentes e nunca nenhuma delas nunca me perguntou se engravidar era algo que estava em meus planos. Nunca. Ouso generalizar aqui, mas acredito que o mesmo deva acontecer com a maioria das mulheres, pelo menos no Brasil.

A possibilidade de infertilidade parece ser um tabu até mesmo nos consultórios médicos. E olha que, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a infertilidade atinge de 8% a 15% de casais no mundo. Não é um índice desprezível a ponto de ser assim tão ignorado.

Eu conheci meu marido aos 25 anos e nos casamos quando eu tinha 27 anos. Os tais 27 anos dos meus planos de adolescência. Mas não tivemos pressa. Nunca nos disseram que poderia ser difícil. E assim nos deparamos, no susto, na marra, com um diagnóstico de infertilidade sem causa aparente, aos 30 anos.

Não significa, claro, que, com aviso prévio, a gravidez viria com mais facilidade. Mas ao menos teríamos mais preparo para lidar com a situação e mais entendimento para tomar algumas decisões. Eu gostaria, sim, que uma médica tivesse me perguntando: "Você já ouviu falar em infertilidade?", "Você gostaria de ter filhos?", "Você gostaria de fazer exames que podem ajudar a diagnosticar a sua capacidade de ter filhos?". Gostaria, ao menos, de ter tido a oportunidade de pensar sobre esse assunto.

Talvez, no meu caso, e somente no meu caso, as tentativas pudessem ter começado aos 27 anos e não aos 30, o que poderia aumentar as minhas chances por conta da idade. Sem garantias, eu sei. Hoje, após três anos de tentativa, essa questão já não me aflige tanto, afinal, não adianta mais pensar no que não pode ser mudado. Mas eu acredito que precisamos falar sobre a infertilidade. Os médicos precisam falar sobre infertilidade. A mídia precisa falar sobre infertilidade. As pessoas precisam falar sobre infertilidade. Mulheres e homens, transgêneros, casais heterossexuais e homossexuais, todos têm direito de saber mais sobre isso.

Essa matéria do Buzzfeed, em inglês, lista 22 coisas que todo casal cisgênero deveria saber sobre fertilidade. Aqui, uma lista com 20 itens para casais transgêneros.




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